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O setor cultural precisa de nós

 

Li na Folha de S. Paulo deste domingo (22) uma entrevista do ator Malvino Salvador. Um dos pontos citados por ele é o ataque que a área cultural tem sofrido no Brasil. “O que eu venho percebendo é uma tentativa de vilipendiar a cultura. Não entendem que é preciso haver fomento. É preciso se pensar na cultura como se pensa no agronegócio e em outras áreas importantes, é preciso injetar dinheiro. O que me angustia nesses últimos anos é perceber uma violência desmedida e descabida contra ela. Virou a Geni”, disse ele[1]. Eu não poderia concordar mais.

Sendo um jovem empreendedor, trabalho para gerar empregos, movimentar a economia. Há alguns anos, mais especificamente, tenho estado à frente do Instituto Cultural Ingá, associação sem fins lucrativos que busca unir empresas que querem apoiar o setor cultural e artistas que precisam de fomento. Todos ganham dessa forma. Os empresários porque, por meio de leis de incentivo, conseguem renúncias fiscais; os artistas, por terem seus projetos viabilizados; o cidadão, por poder consumir uma ação artística gratuita em muitas vezes. Garanto, portanto, que a arte é um mercado possível. Um setor que todos nós precisamos apoiar e ajudar a melhorar. Gera emprego, renda, representando mais de 2% do PIB brasileiro[2].

Em Maringá, o Instituto Cultural Ingá – que fica sob o guarda-chuva da Acim (Associação Comercial e Empresarial de Maringá) – já movimentou R$ 8 milhões desde que foi criado, em 2011[3]. A minha conversa, entretanto, não é para focar apenas no ICI, como o chamamos. Em nossos artigos, temos buscado refletir sobre uma área específica de cada vez e os caminhos possíveis para ela, principalmente em tempos como os atuais, de pandemia da Covid-19.

Maringá tem visto crescimento nas ações de fomento à cultura, muito por conta do poder público. A Prefeitura Municipal oferta anualmente o prêmio Aniceto Matti, cujo valor é de R$ 2 milhões, dividido para diversos projetos. Infelizmente, não temos dados consolidados sobre o quanto esse dinheiro impacta no comercio local. Ainda assim, é possível apontar para onde os recursos vão:  setor de alimentação, rede hoteleira, postos de combustíveis. É que artistas locais e de todo o Brasil utilizam os serviços da cidade quando da realização de eventos. Isso é movimentar a economia. É crescimento.

Aliás, vale registrar que Maringá também tem organizações e atividades culturais independentes, que funcionam sem apoio público São companhias de teatro, clubes de leitura, escolas de dança. Não sei se você sabe, mas por aqui vivem escritores reconhecidos em todo o Brasil.

Em um momento de polarização política e pandemia, precisamos apoiar o setor. 2020 deve ser um ano de resultado ruim para o segmento, visto que, de modo geral, teatros, casas de shows e cinema ou ainda estão fechados ou começaram a reabrir agora, com muitas restrições. A principal medida emergencial do Governo Federal para a cultura foi a lei Aldir Blanc, proposta pela Câmara dos Deputados. Em linhas gerais, consiste em repassar dinheiro para artistas e gestores de espaços culturais por meio dos Fundos Culturais. Maringá, por exemplo, recebeu em torno de R$ 4 milhões[4]. O recurso servirá para apoiar artistas diretamente; a quantia também é para a criação de novos editais. Sabemos que, por conta da burocracia, há dificuldades em fazer o dinheiro chegar à ponta que interessa. Mesmo assim, é um auxílio emergencial.

Talvez você que me lê não seja um ávido consumir de cultura – ou apenas pense que não. A música que você ouve no rádio ou em alguma plataforma de streaming é uma expressão artística. O filme que você assiste na TV também é, e movimentou um batalhão de atores, figurinistas, roteiristas, motoristas. Aliás, o consumo de serviços como Netflix aumentou durante o isolamento imposto pelo novo coronavírus[5]. É impossível viver sem a arte, essa manifestação cultural histórica, em nosso dia a dia.

O fato é que a cultura foi politizada, o que é delicado e ruim.  Um dos principais ataques tem sido contra a Lei Nacional de Fomento à Cultura, antiga lei Rouanet. Há quem diga que a iniciativa distribuía dinheiro para fulano ou sicrano alinhado a uma ideologia. É mentira. O projeto, do início dos anos 1990, era e ainda é muito importante para pequenos e médios grupos sobreviverem, possibilitando atividades e trabalhos como o que fazemos no ICI. Há o que melhorar? Com toda certeza.

De minha parte, sei como é importante o impulso do poder público, mas precisamos ir além. Aos meus colegas empreendedores, penso que é válido procurar caminhos de renúncia fiscal para apoiar o segmento, ainda mais em um momento crítico como o atual. Sei que parece outro mundo, mas compartilhar, curtir e incentivar o trabalho de artistas são ações que fazem diferença. Preste atenção nisso. Se possível, apliquemos dinheiro também.

Temos de nos orgulhar uma cidade como a nossa, cujo nome foi inspirado na canção de Joubert de Carvalho. No Paraná, temos um dos principais nomes do conto: Dalton Trevisan. No Brasil, brilhou e brilham a estrela de Chico Buarque, Carlos Drummond de Andrade, Gal Costa, Zé Celso, Maria Bethânia, Tim Maia, Petra Costa, Chico Anysio. Para além do orgulho, que apoiemos de todas as formas possíveis de fomento à cultura. De nosso bairro à nossa cidade, que vejamos essas ações como grandes ativos de projetar uma sociedade cada vez melhor.

[1] Conferir: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/monicabergamo/2020/11/meu-voto-em-jair-bolsonaro-foi-pragmatico-diz-malvino-salvador.shtml;

[2] Conferir: http://cultura.gov.br/economia-criativa/;

[3] Conferir: https://www.cbnmaringa.com.br/noticia/ha-sete-anos-instituto-cultural-inga-mobiliza-economia-criativa;

[4] Conferir: https://cbnmaringa.com.br/noticia/maringa-recebe-r-26-milhoes-para-lei-aldir-blanc;

[5] Conferir: https://www.b9.com.br/123993/com-pandemia-audiencia-de-streaming-de-video-cresce-20-no-mundo-durante-o-mes-de-marco/;

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